Dúvidas de lógica para o meu eu do futuro parte 3 (FINAL!)

Esse é o terceiro e último post em que registro as principais dúvidas que tive lendo Introdução à Lógica, de Cézar Mortari.

Atualmente estou no fim das minhas férias de janeiro. Ela durou apenas 22 dias por causa de uma greve que todas as universidades federais fizeram no ano passado.

Nesse tempo eu li e tentei fazer quase todos os exercícios dos capítulos 16 e 17 do livro (faltou apenas os exercícios da seção 17.3).

Nesse post falarei sobre as dúvidas que tive enquanto fazia isso.

Caso queira ler os outros posts em que faço isso, acesse:

Dúvidas de lógica para o meu eu do futuro – Quarto 707

Dúvidas de lógica para o meu eu do futuro parte 2 – Quarto 707

Fiz esses posts principalmente para o André do Futuro, mas espero que eles possam acrescentar algo às pessoas que consumiram o Mortari ou estudam lógica (talvez ler minhas dúvidas ajude-os a ver como outra pessoa enxerga a lógica).

Por que criar o predicado ‘x existe’ não é uma boa formalização para a existência?

Uma das frases que a relação de identidade nos permite formalizar é ‘alguém existe’. A formalização é:

    \[\exists x (x = x)\]

No entanto, por que não podemos simplesmente criar um predicado para formalizarmos a existência?

Por exemplo, se P significar ‘x existe’ e a significar ‘André’ então para formalizar que ‘André existe’, bastaria escrever:

    \[Pa\]

O Mortari argumenta que fazer isso seria uma duplicação de esforços, pois para formalizar que existe alguém, escreveríamos:

    \[\exists x Px\]

Que pode ser lido como ‘existe x tal que x existe’, o que é meio redundante.

Mas pergunto isso pois se fosse assim não preciaríamos da igualdade para formalizar que algo existe.

Porque construímos os tablôs semânticos da forma que construímos?

Essa é uma dúvida que tenho desde o capítulo 12 e que voltou agora porque tive que construir tablôs novamente no capítulo 16.

Eu sei que há um meta-teorema que “explica” porque os tablôs semânticos funcionam, mas isso não é o suficiente pra mim. Na minha cabeça nós tínhamos que formalizar a construção de tablôs em uma metalinguagem artificial.

O que é um procedimento de prova?

O Mortari define procedimento de prova como uma forma de saber se uma fórmula é válida ou consequência lógica de outras dentro de um tempo razoável. E também diz que procedimento de prova é o mesmo que algoritmo.

Creio que as tabelas verdade ou os tablôs semânticos sejam exemplos de procedimentos de prova.

A minha dúvida sobre esses procedimentos é que eu não sei porque eles funcionam. Pode-se dizer que essa dúvida é uma generalização da dúvida acima.

Por que podemos admitir fórmulas moleculares como hipóteses na dedução natural?

Não há escrito em nenhum lugar que não podemos usar fórmulas moleculares como hipóteses, mas isso não deixa de ser estranho. Parece roubo, pois facilita demais as demonstrações.

Uma lógica é uma teoria?

(sempre que eu disserteoria daqui pra baixo eu quero me referir a uma teoria formalizada de primeira ordem)

Acho que essa dúvida eu já consigo responder.

Se uma teoria é qualquer subconjunto de uma linguagem, então uma lógica não é uma teoria, pois uma lógica é uma linguagem mais uma relação de consequência lógica.

Uma teoria pode ser metalinguagem de uma lógica?

Se uma teoria é um subconjunto de uma linguagem, então ela também é uma linguagem. E para falar sobre uma lógica precisamos de uma metalinguagem. Logo, cabe a pergunta se uma teoria pode ser a metalinguagem de uma lógica.

Caso a resposta seja sim, isso seria estranho, pois se a teoria fosse a metalinguagem, o poder de expressão da metalinguagem seria menor ou igual ao poder de expressão da linguagem da lógica.

Mas pergunto isso pois suspeito que a teoria de conjuntos é a metalinguagem da lógica.

Qual a diferença entre axiomas lógicos e axiomas não lógicos?

Tudo que o Mortari diz sobre isso no livro é que não teremos axiomas lógicos para o CQC (lógica de primeira ordem) porque estamos utilizando a dedução natural. Mas não lembro dele definir axiomas não lógicos e axiomas lógicos.

Eu acho que os axiomas lógicos são axiomas que pertencem a todas as teorias, e os axiomas não lógicos não pertencem a todas as teorias.

A lógica é analítica?

No livro ‘História da Filosofia Ocidental – Volume 3’, o Bertrand Russell diz que o que caracteriza uma proposição analítica é: o predicado ser parte do sujeito.

Daí, o valor verdade de toda proposição analítica decorre do princípio de não contradição. Logo, ele é conhecido de forma a priori.

Eu achava que a lógica era analítica, mas depois de ler o Mortari não sei se acho mais.

Essa dúvida é bem mais geral que as outras, e por isso finalizo essa série de posts com ela.

Bônus

Resposta para uma dúvida do post passado

No post passado eu havia dito que não sabia explicar porque essa dedução natural está errada:

Uma dedução natural que deduz que todo x é F a partir de que algum x é F.

E agora eu já sei a resposta!

O erro está na linha 3, pois na regra de inferência que introduz o para todo está escrito que a constante ‘a’ da dedução não poderia estar em premissas e nem em hipóteses vigentes, e ela está em uma hipótese vigente!

Realmente eu só precisava ler o livro com mais atenção para responder essa dúvida.

Teoria das descrições definidas

No capítulo 16 o Mortari me apresentou a teoria das descrições, que é a primeira contribuição do Bertrand Russell para a lógica que vejo!

Eu sou um grande fã do Russell então fiquei muito feliz.

Pelo o que eu entendi, as descrições definidas são para resolver paradoxos que aparecem quando tentamos formalizar sentenças do tipo

‘Não existe um círculo quadrado’

Essa é obviamente uma sentença verdadeira, mas a forma mais intuitiva de formalizá-la não preserva sua validade.

Por isso o Russell criou a teoria das descrições definidas, pois com ela é possível formalizar a sentença acima por uma fórmula que é verdadeira.

No livro ‘História da Filosofia Ocidental – Volume 1’, o Russell refuta Platão usando essa teoria, e eu só fui entender de verdade seus argumentos depois de ler o Mortari.

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